O mês de abril começou com boas perspectivas para o produtor brasileiro de soja: é que no dia 16 de março, o governo, após intensas e longas negociações, finalmente definiu um novo cronograma para elevar o porcentual de mistura obrigatória do biodiesel ao óleo diesel. A partir deste mês, a mistura passará dos atuais 10% para 12% — o chamado B12.
O biodiesel é um biocombustível produzido a partir do óleo de soja (cerca de 75%), mas que contém também resíduos animais (sebos e gorduras) e outros componentes. Dessa forma, dá destinação econômica a resíduos que eram considerados passivos, inclusive ambientais, para o agronegócio, entre outros setores.
O cronograma prevê ainda, segundo o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, um aumento escalonado. O porcentual passará para 13% em 2024, para 14% em 2025 e, finalmente, a 15% em 2026. Contudo, os porcentuais podem ser revistos. Segundo os cálculos da pasta, o impacto inicial será de R$ 0,02 nas bombas e, futuramente, de R$ 0,01 a cada porcentual da mistura elevado.
As datas para aumento da mistura foram definidas em reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) no dia 16 de março, com a participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em nota, a Associação de Produtores e Biocombustíveis do Brasil (Aprobio) classificou a decisão como “histórica”.
Impulso ao setor
De fato, a definição do novo cronograma dá um novo ânimo ao mercado de óleos vegetais, uma vez que se espera que a produção de óleo de soja para biodiesel venha a diminuir a ociosidade do parque industrial de processamento desse grão para patamares entre 15% e 20% no decorrer do ano. No ano passado havia a expectativa de retomada dos
14% ainda em 2022, que depois passou para janeiro de 2023 — e 15% a partir de março. Nenhuma dessas projeções acabou se confirmando, sob o argumento da área econômica da época de conter a alta dos combustíveis e evitar a pressão sobre a inflação.
No final do ano passado, medidas tributárias do governo federal estimularam a retração dos preços dos combustíveis e, para não colocar o esforço a perder, o Ministério de Minas e Energia novamente resolveu manter os 10% pelo menos até março deste ano, deixando a decisão para o novo governo. Houve, à época, reação negativa do setor.
Uma das argumentações do governo anterior era os altos preços da matéria-prima, que responde por mais de 70% da fabricação do biodiesel no País. A esperada safra recorde de soja, de 152,35 milhões de toneladas (alta de mais de 20% ante o ciclo anterior, afetado pela seca), era a contraargumentação do setor para convencer o governo a retomar o cronograma da resolução.
No entanto, uma mistura maior também vem sendo alvo da oposição de outros setores, como revendedores de combustíveis e fabricantes de automóveis, que avaliam que níveis acima de 10% (B10) geram problemas para os motores. Mas há vários outros aspectos a serem levados em consideração. “Temos os aspectos ambientais, pois há redução de emissão de gases de efeito estufa”, lembra John Forman, geólogo e membro do CNPE desde 2021.
De fato, o novo governo salienta a necessidade de medidas de reconstrução das políticas públicas e, entre elas, as do setor de biocombustíveis — “todas elas de grande importância para a retomada do desenvolvimento sustentável do País”. Assim, a mensagem com a definição do cronograma reforça os prometidos compromissos governamentais para promoção de uma economia verde e limpa e a retomada de uma posição do País no protagonismo na discussão global sobre questões socioambientais. De quebra, coloca a transição para a economia de baixo carbono como uma vantagem competitiva para o Brasil.
Além disso, na avaliação da Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), a mistura maior de biodiesel traz um saldo positivo para o Brasil, uma vez que o aumento da soja destinada à exportação in natura significa uma receita menor para o
país. De acordo com a entidade, considerando os encadeamentos intersetoriais, cada real adicional de produção de biodiesel promove a inclusão de outros 4,40 reais na economia brasileira.
O próprio Formam, porém, adverte para a alta dos preços, que afetam sobremaneira a população. “Então, é preciso equilibrar essas coisas”, disse em entrevista à agência internacional de notícias Reuters, decretando: “Uma decisão pelo aumento ou não da mistura não significa ser ‘contra ou a favor’ do biodiesel”.
Novas especificações
Dois dias depois da definição do cronograma pelo CNPE, o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) defendeu que a medida seja acompanhada “da revisão urgente das especificações atuais do biodiesel, compatíveis com os novos teores, acompanhando a evolução tecnológica dos motores e as metas governamentais de redução das emissões e da abertura da importação do biodiesel”.
O IBP reconhece que a decisão do aumento de biodiesel ao diesel confere previsibilidade para que toda a cadeia esteja preparada para entregar o produto e programar seus investimentos. Mas destaca que é necessário o enquadramento regulatório de novas e mais modernas rotas tecnológicas de produção de biocombustíveis ciclo diesel. É o caso do diesel verde (HVO) e da parcela renovável do diesel de coprocessamento produzido nas refinarias, hoje tecnologias amplamente utilizadas em nível mundial.
Para o Instituto, os chamados biocombustíveis avançados apresentam maior estabilidade e são drop-in, isto é, podem ser misturados ao diesel fóssil em qualquer proporção, sem a necessidade de adaptações em infraestrutura de movimentação ou nos motores que utilizam o combustível.
A entidade argumenta, ainda, que o incentivo à produção e ao uso desses novos combustíveis renováveis possibilitaria ao Brasil não sofrer atraso tecnológico e atingir teores superiores de redução de emissões de gases efeito estufa (GEE). Além disso, ajudaria a reduzir as importações de diesel, já que o País não produz o suficiente para atender toda a demanda.
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